Philippe Pinel nasceu em 20 de abril de 1745, em Saint-André, Tarn, França, e faleceu em 25 de outubro 1826, em Paris. Filho de médico, formou-se em medicina em Toulouse no ano de 1773. Mudou-se para Paris em 1778 e, para se sustentar, traduzia obras de medicina, ao mesmo tempo em que lecionava matemática.
Nessa época, Pinel visitava doentes mentais confinados e escrevia artigos sobre suas observações. Em 1792, tornou-se médico chefe do asilo, para homens, Bicêtre, em Paris, onde realizou sua primeira grande reforma, ao tirar as correntes dos pacientes. Chefiou, ainda, os serviços médicos do manicômio de Bicêtre, a partir de 1793, e, em 1794, passou a ocupar idêntico posto no Hospital da Salpêtrière, para mulheres. Em 1803, foi eleito membro do Institut de France e, mais tarde, professor de Patologia da Escola de Medicina de Paris.
Sob sua direção, o Hospital da Salpêtrière tornou-se um dos mais conhecidos estabelecimentos neuropsiquiátricos do mundo, sendo que, mais tarde, com acertada justiça, lá seria erguida uma estátua em sua memória.
Costuma-se falar de Philippe Pinel como um homem dotado de generosidade incomum à sua época. Homem bondoso, cheio de atos caridosos para com os sofredores. O libertador dos alienados, aquele que lhes quebrou as correntes e lhes deu dignidade, que os retirou das celas às quais estavam confinados há anos, deixando a sociedade e a classe médica estarrecidas frente a seus atos.
Pinel, como se vê, teve fartas razões para ser considerado pioneiro no tratamento de doentes mentais, sendo um dos precursores da psiquiatria moderna, ramo da medicina a que se dedicou após a tragédia, ocorrida com um amigo seu, que, conta-se, tendo enlouquecido, fugiu para a floresta onde foi devorado por lobos.
Sem dúvida, foi um revolucionário no método de tratamento dos doentes mentais. Para a França Revolucionária, era de profundo interesse que seus cientistas sobressaíssem e Pinel se constituiu, na área da medicina e da psicologia, em um dos seus principais expoentes. Seus escritos privilegiam o refinamento literário, característico da Europa do séc. XVIII e início do séc. XIX, onde, predominaram as concepções de humanismo e liberalismo, de forte influência Iluminista.
Pinel elevou a categoria dos doentes, antes tratados como criminosos ou endemoniados, à condição de “homo paciens” e a doença mental, como o resultado de uma exposição excessiva à estresses sociais e psicológicos, e, em certa medida, a danos hereditários, sendo que tais enfermidades decorreriam de alterações patológicas no cérebro. Com isso, baniu tratamentos antigos tais como sangrias, vômitos, purgações e ventosas, preferindo terapias que incluíssem a aproximação e o contato amigável com o paciente, proporcionando-lhes, ainda, um programa de atividades ocupacionais, onde o tratamento digno e respeitoso foi a tônica.
O século XVII na Europa foi aquele em que reinou, de forma absoluta, a razão, emanada do pensamento de Descartes e entronizada pelos Iluministas. Desta forte tradição, procedeu o pensamento de Philippe Pinel, onde o psíquico se tornou matéria de conhecimento objetivo e quantitativo.
Pinel foi o primeiro a elaborar uma classificação para as doenças mentais, fato este que constituiu extraordinário avanço da psiquiatria. Utilizou como principal método a observação e a análise de seus pacientes.
Em sua primeira obra, Nosographie philosophique (1798) destinada à classificação das doenças, distinguiu várias psicoses e descreveu, dentre outros fenômenos, alucinações, isolamentos, e uma variedade de outros sintomas, o que lhe rendeu grande projeção. Seu principal livro, um dos clássicos da psiquiatria, Traité médico-philosophique sur l’aliénation mentale ou la manie (1801), discutiu sua abordagem psicologicamente orientada.
Pode-se dizer que Philippe Pinel distinguiu-se pelas inovações que introduziu. Sua orientação foi visivelmente psicológica, suas idéias características de sua época, do Iluminismo e das tendências promovidas pela Revolução Francesa: igualdade, liberdade e fraternidade.
A Psicologia, tendo em vista o momento em que as ciências físico-químicas e biológicas monopolizavam as atenções, adotou, com a contribuição de Pinel, um modelo de cientificidade, inspirado no marco referencial Galileico-Baconiano, uma nova epistemologia e uma nova visão do homem que, em determinadas circunstâncias da vida e de sua conflitualidade, expressa o sofrimento humano através da mente e da alma.
Foi dessa forma e somente dessa forma, que a psicologia, na metade do século XIX, aprendeu a considerar o seu material de estudo como parte da natureza, e a tentar explicá-lo em termos naturais, ou seja, a psicologia tornou-se capaz de se constituir uma ciência, tanto na matéria como no método, faltando pouco para passar a ser experimental tarefa empreendida por Wundt, em Leipzig, ao criar o primeiro laboratório de psicologia.
Assim, por qualquer lado que se olhe a vida e a obra desse extraordinário psiquiatra-psicólogo, vamos encontrar sempre a marca de alguém que revolucionou a concepção de loucura de um tempo e promoveu um caminho de humanização e de libertação para o enfermo mental, inscrevendo-o nos mais nobres ideários da modernidade: dignidade e liberdade!
O moderno movimento de humanização dos manicômios, a que estão engajados os organismos de ponta da evolução social, não podem esquecer, na sua trajetória de luta, que o seu representante primeiro, foi, sem sombra de dúvida, Philippe Pinel.